Apesar de o governo do estado do Paraná negar que irá privatizar a Companhia de Saneamento do Paraná (Sanepar), os números da estatal apontam que a empresa precisa de um choque de gestão para aumentar os resultados. Esses números, somados ao discurso liberal e de busca por eficiência que são marca do governador do Paraná, Ratinho Junior (PSD), mostram que há um caminho para a Sanepar ser colocado nas mãos do mercado privado.
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Fonte do mercado financeiro consultada pela reportagem da Gazeta do Povo Recorda que, no ado, o governo de Ratinho Junior tinha negado que abriria mão do controle majoritário da Copel, empresa de energia elétrica do estado, e que foi privatizada em poucos dias em um movimento orquestrado com a Assembleia Legislativa do Paraná.
Sinais do mercado apontam que, no cenário atual, a privatização da Sanepar seria bem-vinda. Apesar do mau momento econômico vivido pelo país em decorrência da política econômica do governo Lula (PT), a ocasião é considerada propícia para investimentos no setor de infraestrutura e saneamento básico. O Marco do Saneamento Básico, aprovado em 2020, abriu as portas para a busca do setor público por capital de empresas privadas interessadas em investir e, como contrapartida, também para que empresas busquem oportunidades no setor.
De acordo com a Associação e Sindicato das Concessionárias Privadas de Serviços Públicos de Água e Esgoto (Abcom Sindcon), cerca de 30% dos municípios brasileiros são atendidos por empresas privadas, contra menos de 6% antes da lei. Nesse período, foram realizados 54 leilões em 20 estadoscom um investimento de R$ 160,6 bilhões e outorgas que somam R$ 55,4 bilhões.
Esse fator, somado à venda de 15% da Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo (Sabesp) por R$ 7 bilhões, no último mês de julho, movimentou o setor público. Foi o que ocorreu com Minas Gerais, onde o governador Romeu Zema (Novo) invejou, em novembro, o projeto de privatização da Companhia Energética de Minas Gerais (Cemig) e da Companhia de Saneamento de Minas Gerais (Copasa).
O setor de saneamento é o ‘filé mignon dos investimentos’, porque não tem crise que derrama água e esgoto regulados. É um investimento seguro e resiliente.
Octavio Magalhães fundador e gestor da Guepardo Investimentos
Ao mesmo tempo, não há empresas de mercado com potencial para investir na Sanepar, como Egea, Equatorial e Iguácandidaturas naturais devido ao histórico no setor e à atração do ativo. “Vamos tentar, com essa etapa de aprendizado gerada na Sabesp, nos capacitar para outras jornadas, talvez como a Copasa e a Sanepar”, disse Radamés Casseb, diretor-executivo da Aegea, em entrevista recente à Folha de S.Paulo.
Em manifestação pública divulgada no último dia 29, o governo do Paraná rechaçou a possibilidade de estar estruturando uma eventual privatização da Sanepar, tendo informado que, “ao contrário do que foi publicado em sites ligados a sindicatos, não trabalha para a privatização da Sanepar” .
A gestão de Ratinho Junior enalteceu a empresa, dizendo que a “transformou na maior companhia de saneamento público do Brasil”, com o que considera “maior ciclo de investimentos de sua história”, com previsão de R$ 11,8 bilhões até 2029. Resultado que, para o governo paranaense, “ajudará o estado a alcançar as metas do marco legal de saneamento antes da previsão da legislação”.
A nota acrescenta que a Sanepar “foi uma das primeiras do Brasil a estabelecer parcerias público-privadas para ajudar a acelerar obras nas cidades paranaenses” e que “a Sanepar recentemente foi eleita a melhor companhia do mundo em ações para a universalização do saneamento pelo Líderes Globais da Água“.
Gestora que mais aportou na Sabesp antes da privatização mudanças fundamentais na Sanepar
Em carta aos cotistas enviada no último dia 2, a gestora Milhas Capitalque possui mais de R$ 500 milhões em gestão e uma posição relevante em papéis da Sanepar, aponta o potencial de valorização da companhia tanto em caso de privatização quanto de reestruturação.
A gestora acertou em 2020, ao investir mais de R$ 600 milhões na Sabesp, a maior posição de um dos seus fundos, tendo sido também um dos maiores investidores antes da privatização da estatal paulista. Na época, quando Tarcísio de Freitas (Republicanos) ainda era ministro de Infraestrutura no governo de Bolsonaro e a privatização da Sabesp estava distante, as ações foram compradas por cerca de R$ 40 – hoje os papéis estão valendo mais de R$ 90.
Na ocasião, o sócio-fundador e diretor de Tecnologia da Informação da Miles, Fabiano Custódio, escreveu cartas e artigos com o mesmo tipo de argumentação sobre a privatização da Sabesp feita agora para a Sanepar, principalmente em relação ao valor das ações, ambas considerações baratas demais.
Cinco principais argumentos levantados pela Miles Capital sobre a Sanepar
O posicionamento da Miles Capital aos cotistas elencou argumentos sobre o ativo da Sanepar. A análise evidencia que, mesmo sem privatização, melhorias significativas podem ser alcançadas pela Sanepar com uma gestão focada em eficiência. Os pontos sobre a Sanepar foram sintetizados da seguinte forma:
- Ineficiência operacional
- A Sanepar opera desde 2017 com uma eficiência cerca de 25% inferior ao padrão regulatório definido pela Agepar (Agência Reguladora do Paraná).
- No período, a ineficiência acumulou R$ 8,5 bilhões, montante suficiente para universalizar o saneamento básico no estado do Paraná.
- O custo médio de um funcionário na Sanepar é 2,2 vezes maior que o das principais empresas privadas do setor, como Aegea, BRK e Iguá, evidenciando uma estrutura de custos desalinhada com o mercado.
2. Potencial de valorização
- Atualmente, a Sanepar negocia 0,5 vezes sua base de ativos, um desconto de 45% em relação ao padrão de mercado para empresas eficientes.
- Caso a empresa atinja o nível de eficiência regulatória, suas ações poderiam valorizar até 130%.
3. Impacto da eficiência na tarifa ao consumidor
- O ganho de eficiência, com uma redução projetada de 40% no custo médio operacional ajustado por escala, permitiria à Sanepar diminuir as tarifas ao consumidor em cerca de 15%.
4. Cenário regulador e histórico
- A revisão tarifária de 2017 foi considerada traumática pelo mercado, com impactos negativos na percepção dos investidores. A partir de 2017, houve queda de aproximadamente 35% no volume de ações negociadas.
- A revisão tarifária prevista para 2025 representa uma oportunidade para a empresa aumentar a previsibilidade regulatória e reduzir percepções de risco.
- O precatório de R$ 4,2 bilhões, que equivale a 43% do valor de mercado da Sanepar, é visto como um potencial de cabeça caso seja confirmado.
5. Comparação com outras estatísticas
- Empresas como Copasa e Cemig, que não foram privatizadas, conseguem melhorar seus resultados operacionais, ando de cerca de 60% de eficiência regulatória para mais de 100%.
- Isso demonstra que, mesmo sem privatização, melhorias significativas podem ser alcançadas pela Sanepar com uma gestão focada em eficiência.
A instabilidade econômica do país leva o gestor a um olhar ativo de menor risco
Renato Gerusalm, gestor de renda variável e renda fixa da Ativo Rizagestora com R$ 14 bilhões sob gestão, concorda que o setor de saneamento básico é pujante e a privatização da Sanepar seria interessante para o estado. Apesar de ter fundos de infraestrutura transferidos para empresas como Sabesp e Equatorial, a gestora não aposta no momento em papéis de empresas como Sanepar e Copasa.
Além de estar descontado há muitos anos, o momento econômico do país traz oportunidades de investimento com menor risco considerado. “Com todas essas incertezas fiscais e políticas do governo Lula, ficou tudo muito barato e há nomes de empresas muito fortes na área de saneamento e no setor elétrico com baixo risco e relação de retorno muito melhor, como Sabesp, Eletrobras e Equatorial”, diz Gerusalmo.
Octavio Magalhães, por sua vez, fundador e gestor da Guepardo Investimentosque possui R$ 4,7 bilhões sob gestão, prefere investir em empresas que já foram privatizadas, como é o caso da Sabesp, que investiu R$ 300 milhões após a desestatização.
Magalhães vê com otimismo empresas de saneamento básico como a Sanepar, mas só depois da privatização com certeza. “Amamos o setor de saneamento básico, este é o 'filé mignon dos investimentos', melhor até que as elétricas, porque não tem crise que derrube água e esgoto regulados. É um investimento seguro e resiliente com fluxo de caixa muito mais previsível. Mas odiamos estatais”, considera ele, apontando a ineficiência do Estado em contraponto com a gestão de empresas pelas privadas.
O gestor desmistifica o fato de que muitos ativos colocados em leilão podem saturar o mercado e afastar investidores, apontando que sempre há interesses específicos no setor. “O capital para saneamento básico é infinito, certamente vai ter fila para comprar depois que houver a privatização. Os gringos amam esses papéis”, afirma ele.
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